Revisão da Constituição

sábado, 12 de abril de 2008

ÍNDICE DAS POSTAGENS

NOTA PRÉVIA
1. Enquadramento histórico
2. Insuficiências do Parlamentarismo
3. Insuficiências da nossa Constituição
Estrutura Social desejável
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA
1. NATUREZA E OBJECTIVOS DO ESTADO
2. ELEMENTOS E SÍMBOLOS DO ESTADO
3. ESTRATÉGIA NACIONAL
4. DIREITOS E DEVERES DOS CIDADÃOS
5. ORGANIZAǺÃO DO ESTADO
6. ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA
7. PRESIDENTE DA REPÚBLICA
8. GOVERO DA REPÚBLICA
9. SENADO DA REPÚBLICA
10. PODER REGIONAL
11. ASSEMBLEIAS REGIONAIS
12. PRESIDENTES DOS GOVERNOS REGIONAIS
13. GOVERNOS REGIONAIS
14. SENADOS REGIONAIS
15. PODER LOCAL
16. ASSEMBLEIAS MUNICIPAIS
17. PRESIDENTES DOS MUNICÍPIOS
18. SENADOS MUNICIPAIS
19. ASSEMBLEIAS DE FREGUESIA
20. PRESIDENTES DAS JUNTAS DE FREGUESIA
21. SENADOS DE FREGUESIA
22. PODER JUDICIAL
23. PODER IDEOLÓGICO
24. PODER ECONÓMICO
25. PODER SINDICAL
26. PODER MEDIÁTICO
27. FORÇAS ARMADAS E DE SEGURANÇA
28. ALTERAÇÕES À CONSTITUIÇÃO
29. DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS
ANEXO A - Estrutura do Estado
ANEXO B - Estrutura do Governo da República
ANEXO C - Competência Legislativa das Regiões Autónomas
ANEXO D - Estrutura dos Governos Regionais
Cálculo da probabilidade da opinião de uma amostra de 2000 eleitores NÃO coincidir com a opinião da totalidade dos eleitores na aprovação de uma lei, considerando-se favoráveis somente as votações que obtenham, pelo menos, 55% de «sim» (1100 votos)
Regras básicas deOrganização
«CURRICULUM VITAE» DO AUTOR

quarta-feira, 9 de abril de 2008

NOTA PRÉVIA

O motivo que nos levou a escrever este contributo para o aperfeiçoamento da nossa Constitição foi a convicção de que, nos tempos de hoje, os elementos essenciais para resolver os problemas de qualquer país são dois: Organização e Formação.
A organização permite aproveitar da melhor forma os recursos humanos, materiais e financeiros disponíveis; a formação permite valorizar indefinidamente os recursos humanos. A formação é cara, difícil de pôr em prática e leva tempo a fornecer resultados significativos. A organização não custa dinheiro, é fácil de pôr em prática e fornece resultados significativos a curto prazo.
Infelizmente os Portugueses, por natureza, são avessos à organização e gostam de resolver tudo através da acção individual. Talvez esta seja a explicação para o facto de quando enquadrados numa cultura nórdica ou quando dirigidos por nórdicos serem elementos de valor acima da média e quando envolvidos na sua própria cultura só conseguirem alcançar êxitos ao nível da pequena empresa.
Será por isso indispensável, para que possamos aproveitar todas as nossas elevadas potencialidades, incluir nos cursos superiores o ensino da organização, valorizar o trabalho em equipa a todos os níveis e, ao mesmo tempo, alterar profundamente a actual Constituição, uma vez que uma boa organização do Estado acarreta de imediato elevados benefícios tanto no campo económico como no campo social.
É claro que não alimentamos a ilusão de que todas as ideias que apresentamos neste trabalho sejam aproveitadas. Mas bastará que uma delas o seja para que fiquemos convencidos de que prestamos um bom serviço ao País. Assim o entendam também os políticos.

1. ENQUADRAMENTO HISTÓRICO

Os factores determinantes da evolução histórica são as descobertas científicas e tecnológicas que modificam de uma forma irreversível a vida do Homem sobre a Terra. A prosperidade e o prestígio das Nações resultam principalmente da capacidade de adaptação às novas situações resultantes das alterações provocadas pelas descobertas cientí-ficas e tecnológicas.

A Idade Média foi a Idade da Agricultura e da Religião. Durante a Idade Média, a política dos Estados era a política de expansão territorial e de expansão da Fé. A reduzida capacidade dos transportes terrestres tornava muito difícil as relações entre as várias comunidades que, por isso, eram obrigadas a resolver todos os seus problemas a nível local. Na guerra predominava a «fortificação», ou seja, o castelo, dentro do qual um pequeno punhado de combatentes podia fazer frente durante longos meses ao assédio de grandes exércitos. Destas circunstâncias resultou o sistema político designado por Feudalismo.

Nos começos do século XV os Portugueses transformaram a caravela num navio oceânico, desenvolveram as técnicas de navegação astronómica e descobriram o regime de ventos no Atlântico Norte e no Atlântico Sul, o que permitiu aos Europeus estabelecerem relações marítimas regulares com a África a sul do Sara, com as Américas, com a Índia, o Sueste Asiático, a China e o Japão. Ao mesmo tempo generalizava-se o uso das armas de fogo e da imprensa, relegando para segundo plano a Nobreza feudal e o Clero. E assim começou uma nova Idade, a Idade Moderna, em que o comércio marítimo transoceânico e os grandes impérios coloniais passaram a ser o factor determinante da riqueza e do prestígio das nações. Pequenos países como foi o caso de Portugal, da Holanda e da Inglaterra tornaram-se grandes potências a nível mundial. O feudalismo morreu, reforçou-se o poder real e floresceram as monarquias absolutas que fizeram a grandeza da Europa e a tornaram senhora do Mundo.

Ao principiar o século XIX entrou em cena a máquina a vapor que multiplicou por milhares a força do Homem e dos animais. A partir de então as descobertas científicas e tecnológicas sucederam-se a um ritmo alucinante: o motor de combustão interna, a electricidade, o telefone, o automóvel, o avião, a rádio, a indústria química, as vacinas, o cinema, etc. Por breves momentos pensou-se que o Homem tinha finalmente acabado por conseguir construir o Paraíso na Terra! As antigas monarquias absolutas foram varridas e foi criado um novo sistema político designado por Democracia Parlamentar, dominado pela classe de Poder Económico, ao qual se opuseram sem êxito vários tipos de sistemas políticos ditatoriais: fascismo, nacional-socialismo, comunismo, etc. É costume designar esta nova Idade por Idade Contemporânea. Mais correcto será designá-la, a partir de agora, por Idade da Indústria, como aliás já o estão fazendo alguns historiadores.

A partir do termo da Segunda Guerra Mundial novas descobertas científicas e tecnológica vieram, mais uma vez, alterar profundamente o modo de viver do Homem: a construção de milhares de armas atómicas com um poder destruidor apocalíptico que tornaram a guerra entre as grandes potências industrializadas impensável; os antibióticos e outros avanços de Medicina que criaram o pesadelo da explosão demográfica; o aumento desvairado da produção industrial, arrastando consigo o problema aparentemente insolúvel de um aumento da poluição capaz de pôr em perigo o próprio «habitat» da espécie humana; o alargamento cada vez maior do fosso que separa os «ricos» dos «pobres», tanto a nível nacional como internacional, gerador de tensões internas e entre países cada vez maiores; a Televisão, a Internet e os computadores que revolucionaram por completo os sistemas de informação e os métodos de trabalho.

Parece-nos evidente que já estamos vivendo numa nova era histórica, que talvez possa ser chamada a Idade da Ecologia, em que as preocupações predominantes de crescimento económico a qualquer preço terão de ser contrabalançadas por preocupações igualmente firmes de respeito pela Natureza, de controlo do crescimento populacional, de harmonia social e de cooperação internacional.
Com a mudança dos grandes períodos históricos muda inevitavelmente o sistema político. Ao Feudalismo sucedeu a Monarquia Absoluta e a esta o Parlamentarismo e as Ditaduras. Será que qualquer destes sistemas continua adaptado às circunstâncias actuais? Cremos que não. Um e outro desempenharam a sua função na época própria, na época da Indústria, mas, como seria de esperar, encontram-se claramente desajustados da realidade actual. A pergunta a fazer será esta: qual a alternativa ao Parlamentarismo e à Ditadura?
Pensamos que a resposta será uma Democracia participativa tirando partido das novas tecnologias de informação.

2. INSUFICIÊNCIAS DO PARLAMENTARISMO

A primeira crítica que se poderá fazer ao sistema de Democracia Parlamentar é a de que conduz à quebra da unidade nacional.
Uma das bases da democracia, como se sabe, é a escolha dos altos dirigentes políticos através de eleições. Mas a eleição conduz inevitavelmente à formação de partidos políticos. E havendo partidos políticos a nação fica irremediavelmente dividida em facções que se guerreiam mutuamente tornando muito difícil uma congregação de esforços para a realização do bem comum.
Para tentar resolver tal problema as monarquias constitucionais conservaram o Rei, como um órgão de poder moderador independente dos partidos políticos, símbolo e pólo de atracção da unidade nacional, e conservaram a figura do Primeiro-Ministro eleito pelo Povo como chefe do poder executivo.
Alguns regimes republicanos, entre os quais o nosso, adoptaram a figura do Presidente da República com funções semelhantes às do antigo Rei, solução obviamente insuficiente para resolver o problema da unidade nacional já que, sendo o Presidente da República escolhido por meio de eleição não pode ser, por muito boa vontade que tenha, o símbolo e o pólo de atracção da desejada unidade nacional. Sendo assim, não tem sentido a existência simultânea de Presidente e de Primeiro-Ministro. Numa república o chefe do poder executivo deverá, logicamente, ser o Presidente da República.
Num regime republicano o pólo de atracção da unidade nacional só poderá ser a Constituição, desde que seja convictamente aceite pela grande maioria dos cidadãos e dos partidos políticos. Para isso é indispensável que a dita constituição seja do tipo «simples» e não «doutrinário», isto é , que se limite a estabelecer nas suas linhas gerais os direitos e deveres dos cidadãos e a organização do Estado abstendo-se de impor qualquer doutrina de carácter económico ou social.

Outra crítica que se poderá fazer ao sistema de Democracia Parlamentar é a de que conduz à instabilidade política.
Uma das bases sagradas da Democracia Parlamentar é a de que o poder legislativo, o poder executivo e o poder judicial (que no seu conjunto formam o poder político) devem ser independentes uns dos outros.
Em teoria, o chefe do poder executivo (Presidente ou Primeiro-ministro) é uma individualidade eleita pelo Povo e o Parlamento uma entidade colectiva independente daquele constituída por representantes do Povo. Em teoria cabe aos representantes do Povo elaborar e promulgar as leis e ao chefe do poder executivo dar-lhes execução, ou seja, governar o País de acordo com elas.
Na prática o que acontece é que o Parlamento não dispõe de meios técnicos que lhe permitam elaborar as leis limitando-se, por isso, salvas raras excepções, a discutir e aprovar as leis propostas pelo Governo. Por outro lado, o Parlamento não é de facto constituído por representantes do Povo mas sim por representantes dos partidos políticos. Mas, para poder governar, o chefe do poder executivo tem de ter o apoio da maioria do Parlamento. Se acontece que um dos partidos tem maioria absoluta no Parlamento temos um Governo estável. Se isso não acontece os partidos têm de fazer coligações, à custa de cedências mútuas, a fim de se conseguir uma maioria parlamentar sem a qual o Governo ficaria manietado.
Em princípio tal solução seria vantajosa porque obrigaria a procurar consensos. Na prática o que se verifica é que as coligações partidárias se desfazem com facilidade levando à «queda» do Governo. Nos países em que há mais de dois partidos importantes, como é, por exemplo, o caso da Itália, os governos têm vida curta.
Para evitar este grave inconveniente muitos países adoptam o sistema bipartidário, o que garante a estabilidade governativa mas tem o inconveniente não menos grave de eliminar os pequenos partidos que são precisamente aqueles de onde geralmente partem as propostas de medidas inovadoras sem as quais as sociedades correm o risco de estagnar.
Acontece também que o facto de o Governo só poder governar quando tem assegurada uma maioria parlamentar acaba por misturar o poder legislativo com o poder executivo transformando ao fim e ao cabo o parlamentarismo numa sucessão de ditaduras temporárias embora sujeitas aos ataques constantes da «oposição» e dos meios de comunicação social.
Quanto a nós, a solução para a instabilidade política inerente ao parlamentarismo passaria pela substituição do Parlamento por uma assembleia constituída por uma amostra representativa da totalidade dos cidadãos eleitores, unicamente com poderes para aprovar ou rejeitar as propostas de lei do Governo sem que a reprovação de qualquer delas implicasse a sua «queda».
É certo que a maioria dos cidadãos não têm competência para se pronunciar sobre os problemas da governação mas para isso é que existem os partidos políticos que a cada momento os poderiam aconselhar a votar «sim» ou «não» em relação a cada proposta do Governo e lhes poderiam explicar minuciosamente as razões porque o deveriam fazer. Os cidadãos só teriam de seguir a opinião do partido que para cada caso lhes merecesse maior confiança.

Outra crítica que se poderá fazer ao parlamentarismo é a de que conduz à degradação dos partidos políticos e ao descrédito dos políticos.
Em princípio, os partidos políticos deveriam ser associações de intelectuais empenhadas em encontrar soluções para os problemas nacionais e em preparar dirigentes políticos capazes de as pôr em prática. Mas não é isso que acontece.
Conforme vimos atrás, o parlamentarismo implica a necessidade de o Governo, para poder governar, ter o apoio de uma maioria parlamentar. Obtida esta, as possibilidades de intervenção construtiva dos partidos da «oposição» na vida política são praticamente nulas. Por mais brilhantes que sejam os argumentos que os seus representantes no Parlamento possam aduzir para demonstrar que uma lei proposta pelo Governo é má já sabem de antemão que ela será aprovada, o que não pode deixar de ser frustrante. Os debates parlamentares têm tão pouco interesse como teria um jogo de futebol a contar para o campeonato em que de antemão já se soubesse o resultado!
Só resta então aos partidos políticos da «oposição», para afirmar a sua existência, tentar por todas as formas desacreditar o Governo perante a opinião pública e demonstrar que tudo quanto faz é mal feito, a fim de o fazer «cair» o mais depressa possível e obrigar a eleições antecipadas.
E assim se transformam os partidos em meras máquinas eleitorais durante os períodos das eleições e em máquinas de obstrução ao Governo nos intervalos destas. Com isso desacreditam o parlamentarismo e desacreditam-se a si próprios.
Cremos que para obviar a este inconveniente seria vantajoso criar junto de cada ministério, com carácter permanente, conselhos consultivos incluindo represen-tantes dos principais partidos políticos, que assim poderiam em devido tempo contribuir com as suas críticas para a feitura das leis, e criar em vez do Parlamento uma assembleia constituída por uma amostra representativa dos cidadãos eleitores. Passariam então os políticos a ter de defender ou atacar objectivamente as propostas de lei apresentadas pelo Governo na certeza de que o seu partido perderia credibilidade se a votação da assembleia lhe fosse desfavorável e ganharia no caso contrário. Obrigados a intervir na vida política de uma forma mais responsável os partidos passariam a desfrutar do respeito e da confiança da opinião pública, a atrair mais e melhores militantes e a tornarem-se elementos mais úteis na prossecução do bem comum.

Mais outra crítica que se poderá fazer ao parlamentarismo é a de que conduz à fragilização das leis.
Dispondo de maioria parlamentar, condição necessária e suficiente para poder governar, o Governo tem a certeza de que qualquer proposta de lei que apresente ao Parlamento será aprovada. Neste caso, se a afirmação de que «os deputados são os representantes do Povo» corresponde à verdade, dever-se-ia concluir que a lei foi aprovada pela maioria do Povo e que, portanto, deverá ser tida e respeitada como tal. Mas, como toda a gente sabe que o Parlamento é constituído por representantes dos partidos políticos e não do Povo, a lei é muito simplesmente considerada como uma imposição do Governo.
Regra geral, uma nova lei vai sempre ferir os hábitos ou os interesses estabelecidos de alguém. Esse alguém protesta. Os que ficaram a lucrar com a lei conservam-se calados. Tal facto é de imediato aproveitado pela «oposição» e pelos meios de comunicação social para denegrir a dita lei e apontar todos os seus malefícios. No subconsciente do cidadão instala-se inevitavelmente a dúvida sobre a qualidade e a legitimidade das leis.
Se as propostas de lei do Governo fossem submetidas a uma assembleia de representantes directos do Povo, é natural que o Governo fosse mais cuidadoso na sua elaboração, uma vez que não podia ter a certeza de que seriam aprovadas e, por outro lado, a sua legitimidade não poderia ser posta em causa nem pelos partidos nem pelo cidadão comum. O prestígio da Lei, elemento bási-co de uma sociedade verdadeiramente democrática, não poderia deixar de aumentar

Mais outra crítica que se poderá fazer ao parlamentarismo é a de que conduz a uma indesejável estrutura social.
Nos regimes parlamentares o poder político, dilacerado por uma permanente guerrilha partidária e constantemente atacado pelos meios de comunicação social e pelos sindicatos, fica muito enfraquecido. Por outro lado, a necessidade de contentar os eleitores a curto prazo torna os Governos particularmente dependentes do poder económico. Deste conjunto de circunstâncias resulta que o parlamentarismo se transforma naturalmente num regime político mais favorável aos mais ricos e socialmente mais fortes e mais desfavorável para os mais pobres e socialmente mais fracos.

Por último poder-se-á acusar o parlamentarismo de não ser capaz de resolver nenhum dos grandes problemas do nosso Tempo e de, antes pelo contrário, agravá-los.
Os países mais ricos, com populações mais instruídas e onde o parlamentarismo tem raízes mais fundas são precisamente aqueles que mais contribuem para o aumento da poluição a nível global e onde o fosso que separa os ricos dos pobres é mais largo. São ainda esses países os que nada fazem para ajudar os países pobres a conter a explosão demográfica, limitando-se a aproveitar-se da exploração dos seus recursos naturais e da mão de obra barata fornecida pelos seus emigrantes.
A verdade é que o parlamentarismo favorece as políticas de curto prazo que são obviamente as que mais interessam para ganhar as próximas eleições hipotecando inevitavelmente o bem-estar das gerações futuras.

3. INSUFICIÊNCIAS DA NOSSA CONSTITUIÇÃO

· Conforme referimos atrás, há dois tipos de constituições: as constituições «simples» e as constituições «doutrinárias». As primeiras limitam-se a consignar os direitos e deveres dos cidadãos e a definir a organização do Estado. As segundas, além disso, impõem a adopção de um dado modelo económico e social. As constituições «simples» são as constituições próprias dos regimes democráticos, as constituições doutrinárias são as constituições próprias dos regimes ditatoriais.
Paradoxalmente a actual constituição portuguesa é uma constituição «doutrinária», apesar de Portugal se afirmar e ser por todos reconhecido como uma democracia. Na realidade a nossa actual Constituição impõe um conjunto de normas de carácter político, económico e social claramente inclinadas para a «esquerda» o que obriga a classificá-la como «doutrinária».
A razão disso é facilmente compreensível se atendermos ao clima pós revolucionário em que foi concebida. Mais do que uma constituição, o documento então produzido como tal foi uma amálgama, obtida à custa de concessões mútuas, dos «programas» dos partidos então dominantes.
Mesmo assim teremos de estar muito gratos aos políticos de todos os quadrantes que a elaboraram e aprovaram, criando as condições que permitiram ao País ultrapassar rapidamente um período de perigosa instabilidade. Não obstante, passadas que são várias décadas, haverá que não ter pejo em reconhecer as deficiências da actual constituição, apesar de já melhorada através de sucessivas revisões pontuais.

A primeira medida que nos parece indispensável para corrigir a actual Constituição é retirar dela e passar para as leis ordinárias todas as referências pormenorizadas a medidas de carácter económico e social que encerra de modo a transformá-la inequivocamente numa constituição «simples» própria de um regime democrático.

A Constituição deve ser um documento curto e claro. Curto para que, na sua essência, possa ser bem conhecido pela generalidade dos cidadãos; claro para que possa ser por eles facilmente entendido e respeitado.
A nossa actual constituição é demasiadamente volumosa mais parecendo um código destinado a ser utilizado por juristas do que um documento destinado a ser ensinado às crianças nas escolas ou a ser lido calmamente ao serão por qualquer cidadão, ainda que de poucas letras.
A actual constituição traduz uma preocupação excessiva em garantir os direitos dos trabalhadores como se o simples facto de nela estarem consignados fosse bastante para os concretizar. Não seria suficiente limitar-se a dizer que os direitos de todos os cidadãos portugueses são os que constam da Declaração Universal dos Direitos do Homem? Assim se poupariam numerosas páginas que em termos práticos nada adiantam e que, pelo seu elevado número, tornam mais difícil o seu entendimento e afastam o cidadão da sua leitura.

A actual Constituição conserva a herança da Monarquia na figura de um Presidente da República a que falta o prestígio do Rei e que para pouco mais serve do que para fragilizar a acção do Primeiro-Ministro.
O poder executivo deve ter uma só cabeça. Para o cidadão comum, o Presidente da República, na qualidade de chefe do Estado e de comandante supremo das Forças Armadas é quem «manda mais». Será por isso de, através da Constituição, dar ao Presidente o estatuto e as responsabilidades que o Povo no seu subconsciente lhe atribui.
Pensamos que a solução, ao mesmo tempo mais elegante e mais funcional, seria colocar dois «primeiros-ministros», com a designação de «Ministros de Estado» na dependência directa do Presidente, um encarregado da área económica e outro da área social, e deixar na dependência directa daquele os ministérios tradicionais da Defesa (antiga Guerra), Negócios Estrangeiros, Finanças (antiga Fazenda) e Administração Interna (antigo Reino e depois Interior). Esta solução teria a vantagem adicional de descentralizar a administração pública de acordo com as regras mais elementares da Organização.

A actual Constituição baseia-se no sofisma de que a Assembleia da República é constituída por representantes do Povo quando na realidade é constituída por representantes dos partidos políticos, sujeitos à disciplina partidária. Assim sendo é óbvio que, para desempenhar as suas funções, bastaria que fosse constituída por um único deputado de cada um dos partidos que nela têm assento levando cada um deles «no bolso» a totalidade dos votos do partido.
O argumento de que a Assembleia da República não serve apenas para aprovar leis mas também para fiscalizar o Governo não colhe, uma vez que o Governo é mais do que fiscalizado, dissecado e chamado constantemente à ordem pelos meios de comunicação social e pelos partidos políticos. Não é por falta de fiscalização que o Governo poderá funcionar mal.
Uma vez que na actualidade toda a gente tem televisão e, consequentemente, está em contacto permanente e directo com o debate político, não seria de entregar o poder legislativo, ou seja, a autoridade para aprovar as propostas de lei do Governo, a uma assembleia constituída por uma amostra representativa de cidadãos eleitores? A proposta poderá parecer demasiadamente ousada mas não se deverá esquecer que a actual constituição segue um modelo que foi criado no século XIX quando os meios de comunicação social eram muito diferentes dos de hoje.

A actual Constituição não fixa a organização dos órgãos do Governo deixando assim de cumprir uma das suas principais funções.
Em resultado disso fica o Governo com mãos livres para criar à vontade o número que entender de ministérios, secretarias de estado, institutos, comissões permanentes, comissões eventuais, altas autoridades e um sem número de órgãos que custam muito dinheiro e que se destinam a fazer aquilo que devia ser feito pelos órgãos já existentes da administração pública que assim são pura e simplesmente postos de lado mas nunca extintos, criando-se um emaranhado de competências que se anulam umas às outras e paralisam o funcionamento do Estado. Mas, como já foi dito, os Portugueses são avessos à Organização e não se pode estranhar que a constituição não fuja à regra.
Pensamos que seria indispensável tentar inverter esta tendência que é a causa principal do nosso atraso em relação às nações mais evoluídas. Para tal seria muito importante que a Constituição estabelecesse com clareza a organização do Estado e dos seus órgãos de nível mais elevado. É o único caso em que, a nosso ver, deveria descer ao pormenor.

Há um ditado chinês que diz que um pequeno desenho traduz melhor uma ideia do que um longo discurso. Para apresentar com clareza uma estrutura orgânica a melhor maneira de o fazer é utilizando um organograma. Infelizmente em Portugal tal palavra provoca de imediato uma repulsa instintiva. Para o português o organograma é pura e simplesmente uma manifestação de autoritarismo, um atentado à sua liberdade individual que o tenta encerrar dentro de um pequeno rectângulo, impedindo-o de fazer aquilo que lhe parece melhor e de interferir no trabalho dos outros.
Também neste ponto nos parece que a Constituição deveria assumir uma posição de liderança nacional não se acanhando de utilizar os organogramas necessários para dar a conhecer ao Povo com toda a clareza e sem ambiguidades a forma como estão articulados entre si os órgãos principais do Estado e a forma como estão distribuídas as suas responsabilidades.

Atrevemo-nos ainda a sugerir que a numeração dos artigos da Constituição seja feita em numeração decimal e não em numeração seguida o que a tornaria mais fácil de consultar e entender e permitiria, em caso de revisão, alterar apenas a numeração dos artigos de um dado capítulo sem ter de alterar a numeração de todos os que se lhe seguem.

Mas a maior crítica que, quanto a nós, se poderá fazer à presente Constituição é a de não ter em conta as profundas alterações que a Televisão (a caixinha que mudou o mundo!) introduziu na vida social.
Nos dias de hoje a política é feita na Televisão e não no Parlamento. Uma Constituição que não tenha em conta esta realidade está irremediavelmente condenada a ser pura e simplesmente ignorada pelo cidadão comum de quem deveria ser guia e motivo de orgulho.
É nossa convicção que, mais ano menos ano, em algum País se chegará à conclusão óbvia de que, actualmente, a Política, é feita com base na Televisão e nas sondagens e que a sua Constituição seja alterada adoptando nas suas linhas gerais o modelo que a título de exemplo apresentamos a seguir. Se isso vier a acontecer e nos virmos obrigados a importar a ideia é natural que fiquemos todos muito pesarosos por não ter aproveitado a oportunidade para ser pioneiros nessa matéria.

CONSTITUIÇÃO
DA REPÚBLICA PORTUGUESA